sábado, 16 de julho de 2011

Não dá pra dormir.

Tempos atrás, estávamos convencidos de que, quanto mais informação tínhamos, mais conscientes éramos como cidadãos e mais capazes de fazer escolhas bem informadas. Hoje, quanto mais informação temos, mais dúvidas surgem. No fim, em lugar de nos sentirmos mais seguros, nos sentimos mais incertos.



Ter mais informação é inquietanteQuero dar alguns exemplos. Não sei quantos recordam que Julian Assange declarou, pouco antes de ser preso pela polícia, que o Wikileaks distribuiria uma documentação completa sobre como um importante banco norte-americano cometera práticas fraudulentas que o levaram à beira da falência, da qual se salvou graças às contribuições estatais. O governo dos Estados Unidos está para concluir seu segundo plano de salvação para os bancos, após o de US$ 750 bilhões da administração Bush. Calcula-se que no mundo foram investidos US$ 2,3 trilhões para salvar o sistema financeiro.



Passaram-se meses, e nada mais se soube sobre este assunto. Certamente, é muito mais prejudicial para os governos uma documentação sobre a responsabilidade do sistema financeiro de uma crise que afetou centenas de milhões de pessoas em todo o mundo (há 40 milhões de novos pobres, segundo a OIT), do que as revelações dos comentários das embaixadas norte-americanas. E nos perguntamos: o que aconteceu com isto?



Agora sabemos muito sobre as práticas fraudulentas e totalmente antiprofissionais que levaram à crise do sistema financeiro. Tanto isto é verdade, que vários bancos pagaram penalidades importantes para evitar processos criminais, que com toda certeza perderiam. Entretanto, nos tradicionais bônus de final de ano o pessoal dos grandes bancos norte-americanos dividiu a módica quantia de US$ 20 bilhões, como se nada tivesse acontecido.



Quando um sistema comete atos ilícitos, que levam à miséria uma parte da humanidade, e forçam uma corrida suicida dos países ricos para combater o déficit fiscal (e não o déficit social), supõe-se que a justiça castigará os responsáveis. Mas, até hoje, quantos funcionários de Wall Street foram incriminados? Um. Repetimos. Exatamente um. Trata-se do jovem francês Fabrice Tourrè, um quadro menor da Goldman Sachs, que pagou multa de US$ 550 milhões para evitar um processo. Tourrè é acusado de “ter criado um fraudulento sistema de venda de hipotecas”. O jovem trabalhava em um setor da Goldman Sachs sob comando de Jonathan Egon, o criador da fraude. A defesa de Tourrè demonstrou que ele era um dos menos importantes em uma equipe de 15 pessoas. O banco o transferiu no ano passado para Londres, onde não quer dar declarações e goza de férias pagas. Não é inevitável perguntar que lógica tem esta história?



Também é inevitável que esta pergunta possa ser vista como um sintoma da tese da inocência bancária que os financistas e seus lobbies tentam instilar na opinião pública: a Grande Recessão que ainda sofremos – afirmam – não teria sido causada pelas estendidas práticas bancárias fraudulentas, mas pelas oscilações do mercado, que fizeram explodir uma bolha financeira. Na especulação desenfreada teriam incorrido apenas contadas exceções como Bernard L. Madoff, que deliberadamente fraudou cerca de US$ 40 bilhões, e que está justamente condenado a mais de dois séculos de prisão. Teríamos, portanto, de nos convencermos de que o sistema financeiro é sólido, são, eficiente e responsável.



Infelizmente, quando se observa o caso Madoff descobre-se que a entidade que cuida desses crimes, a Security Investor Protection Corporation, contratou a empresa de advogados Baker & Hostetler para liquidar as propriedades de Madoff e compensar parcialmente os investidores fraudados. Este escritório, até agora, resgatou US$ 318 milhões, e o juiz Burton Lifland acaba de lhe conceder honorários de US$ 43,2 milhões apenas pelo período de outubro a janeiro deste ano. O liquidador, Irving Picard, cobrou pelos quatro meses US$ 713.799. Como funciona uma justiça que subtrai somas tão ingentes dos legítimos destinatários, ou seja, as vítimas da fraude?



É lamentável que não exista uma resposta, ou, pelo menos, uma informação confiável disponível na mídia, para perguntas como esta, que é apenas uma das dezenas de não esclarecidos comportamentos dos banqueiros e das instituições de vigilância financeira que convergiram para a catastrófica crise recessiva destes anos.



O verdadeiro problema é que o cidadão a cada dia tem menos confiança nas instituições e tende a suspeitar que muitas coisas que são pouco lógicas ou compreensíveis podem ser um complô.



A conclusão é que não precisamos de mais informação, mas de informação melhor e mais confiável. Assim, todos estaríamos com a mente mais tranquila e dormiríamos em paz.



Abraços.



LUIZ TOMAZ COSTA

Código Rural, quer dizer, Florestal

A sociedade brasileira pasma-se diante da decifração do Código Florestal.



Os olhares ingênuos de milhões mal sabem de que trata o episódio político. Outros entendem um pouco do assunto, mas não sabem como nem por onde podem contribuir.

Dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) indicam que a Amazônia é o bioma onde mais se destroi o entorno ambiental, cujo mínimo de preservação se propõe em 80% da área. A instituição aplicou aproximadamente treze mil multas no valor total de R$2,4 bilhões até 22 de julho de 2008.

Sofremos uma derrota parcial desde que a Câmara dos Deputados aprovou em 24 de maio de 2011 o Projeto de Lei n° 1876 de 1999 sobre a reforma do Código Florestal.

O PL 1876/99 prevê anistia da infração contra áreas de preservação permanente (APP) ocupadas com agricultura, pecuária e turismo previamente a 22 de julho de 2008. Não haveria, portanto, exigência de recomposição destas áreas devastadas por manobras de interpretação jurídica, por mais “brasileiro” que fosse o intérprete. O PL daria mais autonomia legislativa aos estados sobre as políticas ambientais em relação à União, assim como a compressão das faixas de proteção de rios pela medição da largura a partir do leito regular em vez das cheias.

Aos poucos, os defensores da depredação ambiental confeccionam artifícios juríficos para a funesta economia agroexportadora que rende ao Brasil o título de “emergente”, mas sacrifica sua população a pagar um preço elevado para comer, respirar e viver.

O estigma dos ambientalistas provém contraditoriamente do pensar coletivo, mas não impede que os taxem de anti-democráticos ou de tendências autoritárias.

Denuncie, morador de áreas degradadas e vítima da peta da “responsabilidade ambiental”, e colabore para a recuperação da dignidade de nosso país e o bem-estar da população.

O Senado Federal está com a palavra no tocante à decisão do poder legislativo sobre a matéria em pauta e evidência.

E que se lembrem os senadores de sua função como guardiões dos interesses do Estado brasileiro em detrimento da petulância das agremiações econômicas, como as associações comerciais, federações industriais, confederações disso ou daquilo.

Uma destas alçou Kátia Abreu como senadora de Tocantins, estado derradeiro na divisão territorial do país e que recortou Goiás. E que nos preparemos para a ascensão de novas figuras políticas como ela no Pará caso haja a cisão deste estado em três unidades.

Kátia Abreu declarou audazmente em seu portal eletrônico que o novo Código Florestal Brasileiro não trata de anistia aos devastadores do meio ambiente, uma vez que “anistia seria livrar o agricultor da multa e não exigir nada em troca”. Aproveitei para ler seu artigo “O preço dos alimentos”, que é calafriento, uma vez que sugere o aumento da produção de alimentos no Brasil a fim de saciar a “elevação da demanda nas regiões pobres do mundo, em especial na Ásia”. Quanta generosidade! A senadora tergiversa o conceito de “produtores rurais” e recorre ao argumento de solução telúrica à falta de alimentos, como se os asiáticos precisassem mais do pão de cada dia do que os pobres das cidades brasileiras.

Estes produtores agrícolas, em parte detentores de propriedades imensas de monocultura agroexportadora, não se preocupam com o desabastecimento interno de alimentos e as doses elevadas de fertilizantes químicos para controle de pragas da lavoura.

Urge, destarte, a repartição de terras para o desenvolvimento de agricultura familiar, de atendimento à demanda regional, e uso mínimo de agrotóxicos. Antes de que os conservadores contraargumentem sobre a reforma agrária, adianto que não há serventia deter capital tecnológico produtivo elevado se o produtor não visa ao abastecimento interno, mas à “demanda internacional” ou ao “mercado crescente”.

A reforma do Código Florestal de setembro de 1965 visa a reduzir o compromisso ambiental dos barões da propriedade privada e paladinos do mercado livre e a corroborar o rol do Brasil como merendeiro de nações mais ricas e menos desiguais.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) emitiu nota de que o Brasil atrasará o cumprimento da meta de emissão de gás carbônico caso o Senado aprove a reforma do Código Florestal como ela saiu da Câmara.

Assim, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) incita a que o Senado amplie o debate ambiental a fim de escutar entidades técnicas.

O projeto de lei tramita há mais de dez anos, mas o melindre do tema convoca a uma discussão mais profunda e que vise ao interesse coletivo e não só da comunidade agrária.

É inevitável o choque de modelos de desenvolvimento que se resume, grosso modo, nos “ambientalistas”, de um lado, e os “ruralistas”, de outro.

Seu papel, leitor e benfeitor, não é o de esperar passivamente que o problema incida no quintal de casa para tomar uma atitude ou que alguém o resolva.

Pense no ar que respira, a água que bebe, e o alimento que hoje come, mas amanhã será mercadoria de luxo de uma economia agroexportadora que um consumidor asiático terá condições de comprar e você não, segundo o raciocínio mercadotécnico de Kátia Abreu.

Quem quer ficar com os prejuízos ambientais e sociais?